quinta-feira, 23 de junho de 2011

As diferentes formas de poder que atuam na sociedade contemporânea, baseado em Foucault

Michel Foucault considera que “o poder não pode ser obtido, conquistado ou perdido. Ele é exercitado.” Sendo assim, conclui que o poder não pode estar restrito ao Estado, na medida em que não é só o Estado que está em exercício e mostra que o poder foi construído a partir das micro-relações. Para isto, o autor utiliza um modelo horizontal de visualização da sociedade no qual estão as diversas instituições que possuem poder, ou seja, micro-poderes em torno do poder do Estado. 
Existem inúmeras esferas de micro-poderes que atuam na sociedade contemporânea, como por exemplo, o trabalho, a escola, a família, a religião... Isto pode ser visualizado quando pensamos no comportamento dos indivíduos nestes diversos âmbitos: a maneira como um homem age no ambiente de trabalho não é a mesma maneira como ele age no ambiente familiar, por exemplo.
Cada micro-poder tem suas regras próprias, tendo como objetivo final, adaptar os indivíduos às regras sociais. Portanto, essas microrrelações de poder ultrapassam o poder do Estado, ao mesmo tempo em que são necessárias à existência dele, já que docilizam e adaptam o homem, facilitando o poder estatal. 
Sendo característica de todos os poderes a presença do poder disciplinar (este caracterizado pela necessidade de ser localizado em um tempo e espaço; ser dotado vigilância; e ser produtor de um saber) percebe-se como eles conseguem eficazmente ‘’doutrinar’’ a vida do homem. Pela vigilância, há maior controle; pela produção de um saber, maior eficiência da execução deste poder. Dessa forma, mesmo nas situações das mais cotidianas, pode-se perceber o controle dos diversos poderes que permeiam a vida: um professor, em suas aulas com hora marcada, na sala definida, consegue ver todos seus alunos ao mesmo tempo, e pela vigilância, os controla melhor. Pela experiência do dia-a-dia, ele acaba atingindo meios mais eficazes de exercer o poder sobre seus alunos, observando as maneiras pelas quais eles reagem de acordo com os limites e regras impostos.
Sofrer as microrrelações de poder, passar por essa permutação de poderes, é o que, segundo Foucault, forma o indivíduo. Os indivíduos servem voluntariamente, pois, além de nem perceberem esses micropoderes sobre eles, o que mostra a eficiência destes sobre um poder soberano centralizado somente no Estado; os indivíduos estão também acostumados a servir, na medida em que foram criados dentro de uma sociedade disciplinar que desde sempre os educou com base no respeito às regras.
Conforme as sociedades modernas foram se formando, e as pessoas passaram a se individualizar e diferenciar mais, tal adaptação à submissão se tornou uma vontade e uma necessidade, por parte dos indivíduos, de serem submissos. Uma nova forma de poder, mais eficaz no controle, começou a ser aplicado pela instituição mais forte, o Estado, então: o biopoder, que tem como objetivo a manutenção da vida. Para isso, entretanto, o Estado tem que estar a par da vida dos indivíduos, premissa que legitima tanto a submissão das pessoas a ele como o controle, por parte do Estado, sobre a vida delas.
O Estado, então, passou a ter o dever de proteger e garantir a vida de sua população. Para isso, definiu que deve controlar todos os âmbitos da vida delas para se manter a par de seus problemas, conseguindo, consequentemente, criar políticas públicas que sejam eficazes. Declaração de imposto de renda, Censo, e outras medidas não passam, então, de formas de controle do Estado, que através da sua aproximação com os indivíduos, traz melhorias a estes, fazendo com que estes o legitimem.
Conclui-se, portanto, que no mundo contemporâneo a sociedade é uma sociedade disciplinar, educada em meio aos poderes disciplinares, presentes em diversos âmbitos da vida humana, que têm por objetivo tornar os indivíduos dóceis a este poder supremo do Estado e que este, para legitimar sua supremacia, mantém a maioria dos indivíduos satisfeitos com a sua conduta através da realização de obras que sejam boas a estes e que foram, porém, fruto do controle exercido sobre a vida delas. Sendo assim podemos analisar a vida de um indivíduo como fruto da influência dos micro-poderes e também do controle do Estado sobre ela. Por exemplo: Uma criança sofre influências do poder da família na sua formação e também a do poder da escola. Mais tarde, sofre influencia da Igreja e depois das normas de seu emprego. Esse indivíduo presta contas ao Estado, deixando-o “participar” de sua vida para que seja beneficiado por ele e, com tudo isso, se torna acostumado a seguir regras e a ser submisso ao Estado, que é visto como “bom” para ele, mesmo que não seja. É dessa forma que o Estado garante que seus cidadãos sejam ideais, ou seja, sejam dóceis e submissos ao seu poder.  


4 comentários:

  1. É claro que o biopoder e suas diferentes formas de aplicação constituem a legitimação e a fundamentação do poder estatal contemporâneo; mas, se se considera essas formas de imposição sob um aspecto, em sua totalidade, apenas negativo,a única forma, talvez possível, de se subtrair às arbitrariedades e aos desígnios autoritários desse corpo político constitua uma negatividade (senão maior) de mesmo grau que sua antinomia: a anarquia. Se se considera como forma de recuperar a liberdade e furtar-se da opressão corromper e destruir esses micropoderes e todo esse biopoder,o fim último do Estado, de manter a ordem e de guarnecer o bem mais estimado de seus súditos, não pode ser mais alcançado, e essa estrutura soberana ruiria de forma abjeta e assim retornariamos ao infame Estado de Natureza.
    Comentado por Denis Cabrerizo.

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  2. De acordo com a primeira parte da conclusão, trago a ideia de que a satisfação trazida pelos micro atendimentos ao povo de forma um tanto quanto especifica ao considerar a totalidade de um corpo nacional, por meio dos micro poderes, concebe uma impressão de felicidade e direito atendido aos cidadãos que esperam justamente o atendimento de suas necessidades do Estado que lhes institucionaliza. Portanto, seria inviável pensar a ausência deste controle disfarçado por ações públicas, já que não existe outra forma de atender de forma eficiente as principais demandas das massas, que apesar de uma falsa impressão, adquirem certa satisfação.

    Guilherme Lorando RA00097331

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  3. Gostaria, primeiramente, de parabenizá-las pelo posicionamento crítico em relação às instituições disciplinadoras e da tamanha eficácia de sua 'domesticação', tanto é que levam a esse estado de falta de consciência (sob uma perspectiva frankfurtiana) e de servidão voluntária - como colocado por vocês na conclusão. Sob meu ver, faltou a menção ao racismo, mecanismo de manutenção do Estado e do biopoder enquanto benfeitores da espécie, uma vez que é a partir desse ponto que os presídios, hospícios, preconceitos e tantas outras políticas definidoras daqueles que merecem ou não atenção do Estado, continuam aumentando a desigualdade. Assim, é importante nos perguntarmos até que ponto o Estado, mesmo utilizando uma visão contratualista hobbesiana, garante a vida. Ou melhor, quais os mecanismos que definem os que merecem, se não os de manutenção dos interesses capitalistas (pessoas produtivas, acomodadas e não-pensantes)? Quer dizer, eu acho bastante aplicável aos dias de hoje quando Rousseau no séc XVIII e os Frankfurtianos no séc XX dizem que a razão e seus instrumentos (mecanismos reguladores e instituições) trouxeram desigualdade e violência.
    O que é inviável, é que, por estarem alienadas (pelas instituições disciplinadoras e hoje pela Indústria Cultural) e doutrinadas pelo corporativismo do capitalismo, acreditemos que as pessoas estejam satisfeitas com a situação, quando elas nem realmente sabem que estão na situação! Não é compreensível que se deixe de pensar em liberdade (mesmo sabendo que ela também necessita de limites) e igualdade (a razão de tudo isso, uma vez que há muito constatou-se que todos somos humanos) simplesmente porque uma abolição das instituições que nos aprisionam tende à 'anarquia' .
    Afinal, qual a segurança (a humanidade) de um mundo onde os interesses econômicos ditam as leis? Não vivemos nós em um 'Estado de Natureza' hobbesiano? Ausência de coerção não significa ausência de ordem, principalmente porque é justamente pela educação que acredito ser a saída para essa dominação legitimada pelos dominados, senão por uma revolta armada. Liberdade não quer dizer caos. Mas antes que decida o que ela quer ou não dizer, é preciso que saibam, antes de tudo, que isso que temos, não é liberdade.

    Marília Pinheiro

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